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pólo sul

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Dom | 20.06.21

[122] este livro não merece o leitor que eu sou

polosul

Há livros assim. Começamos a ler, uma torrente de ideias, emoções e sonhos percorrem-nos, o destino perfila-se com milhentas possibilidades e acordamos a perguntar se teremos meia-hora ou 15 minutos para ler mais um pedacinho, ser invadido pela diferente, mas nosso igual.

"Ter um nome que não somos nós é como ter um pássaro fechado numa gaiola. Um pássaro proibido de voar. A negação de um pássaro." (p. 28) Só isto dava para escrever outro livro.

sabiá na Gaiola.jpg

E mais à frente isto, a propósito de nomes: "De repente, um lugar qualquer do mundo chamam-me e eu vou. Às vezes é um som: Ngorongoro, Ispahan, Oulam Bator, Samarcanda, Ougadougou, Panachajel, Tegucigalpa, Timbuktu, Rangoon, Adis Abeba, Machu Pichu..." (p. 54)

Mas eu não fui um bom leitor, por isso digo que não quero apenas aquilo, uns pingos de prosa aqui, uns pingos de poesia ali; uns pós disto e daquilo, por ali e acoli; preciso de mais, é indispensável espremer a história ou as palavas na história. Dá trabalho. A mim deu, mas não me esforcei, e por ali fiquei, sem sentir que ia para algures ou que não me encaminhava para nenhures. Nem sequer precisa de ser uma boa história, mas preciso da história, é a  ossatura do puzzle, é a estrutura mínima de que preciso para dizer "eis o livro!". Não vi. Falta-me o talento. Melhores dias virão e quem sabe , amadurecido, paciente, ponderado e perspicaz descubro a história onde ela existe mas sou incapaz de a reconhecer. Ou melhor, sentir.

Ter | 08.06.21

[121] Caderno de Memórias Coloniais

polosul

isa_figueiredo.jpg

Este livro merecia mais páginas. Este caderno é curto. Suspeito que algures haverá um baú com muito mais.

Uma vez, quando ia de autocarro com a minha mãe, também me aconteceu (mais ou menos) isto:

"Uma revelação, um milagre: num segundo, sem explicação, li alto, e de uma só vez, a publicidade pintada nas laterais dos prédios, «Singer, a sua máquina de costura; beba Coca-Cola; Pilhas Tudor (...)." (p. 59)

A A. disse ao pai que já sabia ler. Eu disse à minha mãe. Ela sorriu e deu-me um beijinho na testa.

Podemos ler sobre a A., ou sobre o que podemos presumir ser dela; sobre a relação com o pai (a entrevista no final do livro esclarece); sobre a relação entre brancos e negros; e espreitar uma nesga da vida em Lourenço Marques, ou melhor, em Maputo, sendo certo que:

"Presos na sua certeza absoluta, nenhum admitirá a mentira que edificou para caminhar sem culpa ou caminhar, apenas." (p. 115)