É uma obra de ficção ou autobiográfica? Serve para consolar, lamuriar ou redimir da morte de uma filha? Quem disse que construir uma narrativa coerente e de aceitação sobre um trauma nos pode salvar?
Texto fragmentado, de frases soltas e curtas, onde parece reinar o caos. O fim da história já está no título, como um puzzle cuja imagem já é conhecida.
E agora Tiago Ferro, o que vai ser de ti, quando o "presente muda todo o passado"?
A peça de teatro de R. Brandão é coisa pouca, umas quantas dezenas de páginas, proporciona o aquecimento para ascender às obras de maior fôlego, ao Húmus, às Memórias.
Uma das personagens, vai advertindo: "Morrer é uma coisa muito séria, é um acto que importa certa preparação." (p. 21)
E nós ali, a procurar decifrar aqueles caminhos de literato, até que ele diz, como quem não quer a coisa: "O que lá está, em regra, não presta para nada; o que cada um de nós constrói sobre a linha, a cor e o som, é que é verdadeiramente superior." (p. 23)
Requere-se cautela a quem se atirar a este livro despreparado, quem é como quem diz, tem de se fazer acompanhar do google e um bocadinho conhecedor da(s) história(s) sobre racismo na América, caso contrário, o rísivel e o pungente passam ao largo. Se houver pedalada para uma leitura acelerada, disponibilidade para as histórias dentro da história e desfrutar de um estilo torrencial e erudito, é este o livro. Mas não digam que não avisei.
Uma das frases chave, que por si só daria outro livro: "a verdadeira liberdade é ter o direito de ser escravo." (p. 94)