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pólo sul

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Dom | 30.08.09

[87] O nada pedir

polosul

 

 

"Ricardo Reis faz um gesto com as mãos, tacteia o ar cinzento, depois, mal distinguindo as palavras que vai traçando no papel, escreve, Aos deuses peço só que me concedam o nada lhes pedir, e tendo escrito não soube o que mais dizer, há ocasiões assim, acreditamos na importância do que dissemos ou escrevemos até um certo ponto, apenas porque não foi possível calar os sons ou apagar os traços, mas entra-nos no corpo a tentação da mudez, a fascinação da imobilidade, estar como estão os deuses, calados e quietos, assistindo apenas." (p.46-47)

 

Dom | 30.08.09

[86] Remexer no passado

polosul

 

Não sei se é saudável reler estas coisas com um calor de mais de 30 graus lá fora, mas dá sempre que pensar:

 

"O mito do eterno retorno diz-nos, pela negativa, que esta vida, que há-de desaparecer de uma vez por todas para nunca mais voltar, é semelhante a uma sombra, é desprovida de peso, que, de hoje em diante e para todo o sempre, se encontra morta e que, por muito atroz, por muito bela, por muito esplêndida que seja essa beleza, esse horror, esse esplendor não têm qualquer sentido. Não vale mais do que uma guerra qualquer do século XIV entre dois reinos africanos, embora neles tenham perecido trezentos mil negros entre suplícios indescritíveis." (p. 11)

 

 

Dom | 30.08.09

[85] Sobre escrever seja lá o que for

polosul

 

Em registo biográfico, Murakami escreve, em reflexão atlética esforçada, liquidando ilusões sobre a inspiração (p. 76-78):

 

"In every interview I`m asked what`s the most important quality a novelist has to have. It`s pretty obvious: talent. No matter how much enthusiasm and effort you put into writing, if you totally lack literary talent you can forget about being a novelist."

 

"If I`m asked what the next most important quality is for a novelist, that`s easy too: focus - the ability to concentrate all your limited talents on whatever`s critical at the moment."

 

"After focus, the next most important thing for a novelist is, hands down, endurance."

Sab | 29.08.09

[82] O animal velho, à Roth

polosul

Primeiro o filme. Chama-se Elegia e o princípio resume-se no seguinte:

 

O carismático professor David Kepesh [Ben Kingsley] tem como fantasia perseguir estudantes aventureiras mas acaba por nunca deixar as mulheres aproximarem-se demasiado. Porém, quando a esbelta Consuela Castillo [Penelope Cruz] entra na sua sala de aula, tudo pode mudar.

 

Depois fui ler o livro, O Animal Moribundo, e relembrei as derivas e obsessões sexuais de Roth que já conhecia do Complexo de Portnoy e de Teatro de Sabath.

 

 

O estilo manteve-se n`O Animal Moribundo, mas consegui encontrar  este rasgo de clarividência (p. 40-41):

 

"No passado, livrava-me invariavelmente das mulheres que exigiam troca regular de telefonemas, mas agora sou eu quem a exige a ela: a dose telefónica diária. Por que a lisonjeio quando falamos? Por que não deixo de lhe dizer quanto é perfeita? Por que será que tenho sempre a sensação de lhe estar a dizer a coisa errada? Sou incapaz de perceber o que pensa ela a meu respeito, o que pensa a respeito de tudo, e a minha confusão leva-me a dizer coisas que soam a falso ou exageradas aos meus ouvidos, e por isso desligo cheio de ressentimento silencioso contra ela."

 

"Um homem jovem vai encontrá-la arrebatá-la. Arrebatá-la de mim que ateei os seus sentidos, que lhe dei a sua estatura, que fui o catalisador da sua emancipação e a preparei para ele.

Como sei que um homem jovem a arrebatará? Sei porque outrora fui o homem jovem que o teria feito."

 

Sex | 28.08.09

[80] O homem de Santa Comba

polosul

 

Numa edição muito mais antiga do que a da foto, li isto, sem acentos e tudo:

 

"Esse socialismo de Estado, que muitos apregoam e aconselham como um regime avançado, seria, na verdade, o sistema ideal para lisonjear o comodismo nato e o delirio burocratico do comum dos portugueses. Nada mais comodo, mais garantido, mais tranquilo, do que viver à custa do Estado, com a certeza do ordenado no fim do mês e da reforma no fim da vida, sem a preocupação da ruina ou da falencia. O socialismo de estado é o regime burguês por excelencia." (p. 64)

 

Quem disse que o ditador não era do seu tempo?

Ter | 25.08.09

[79] Estar com a mosca

polosul

  

 

"Quando os humanos partirem, os mosquitos estarão entre os beneficiários imediatos da nossa ausência. Apesar de a nossa visão antropocêntrica do mundo nos poder levar a pensar que o sangue humano é essencial para a sua sobrevivência, a verdade é que eles são gourmets versáteis, capazes de sugar as veias da maioria dos mamíferos de sangue quente, répteis de sangue frio, e até aves." (p. 143)