[65] Poemas de amor!?
A Assírio & Alvim publicou há uns anos um livrinho intitulado Poemas de Amor do Antigo Egipto, escolhidos por Ezra Pound e Noel Stock, contendo poemas entre 1567 e 1085, antes de Cristo.
Por obra e graça de mão amiga lancei-lhe as garras, à espera de uma manhã bem passada, a espreitar pelo ombro dos antigos amantes egipcíos enquanto a chuva, lá fora, aumentava a sensação confortável de expectativa literária e sentimental.
Embora alguns textos sejam interessantes, falta-lhes a textura dos sentimentos. Ao que parece, os egipcíos preferem as metáforas associadas aos aspectos muito práticos da vida, como seja:
Ela é uma coleccionadora de homens.
Tão eficaz como o colector de impostos e o seu laço
Perseguindo o gado de qualquer pobre lavrador.
(pág. 60)
À parte estes pormenores estéticos, é assombroso que tenha passado pela cabeça do colector dos poemas (no caso, parece ter sido Noel Stock) considerar como um poema de amor e pespegá-lo no capítulo das Frases Delicadas, isso mesmo, Frases Delicadas, este naco de excelsa poesia:
Recuso tolerar os seus insultos.
Fez-me esperar horas à porta quando a fui ver
E quando finalmente apareceu, ela
Nem sequer disse boa noite, a reles puta.
Deus meu, como está mudada.
Não quer passar a noite comigo.
Nem sequer me dirige a palavra.
(pág. 62)