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pólo sul

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Seg | 09.08.21

[128] A estrela de Clarice Lispector

polosul

Macabéa, a protagonista do livro, merecia mais de Olímpico, o homem por quem se apaixonou. Aqui não há uma história de amor, há, sobretudo, uma história de desencontro. Parece gasto e repisado, eu sei. Mas é o que é.

Se já tentou ler outros livros de Clarice Lispector e não conseguiu, esta última obra, publicada pouco antes de morrer, é um bom ponto de partida. Há quem desista de ler este livro porque fica confuso com a perspetiva do narrador e as suas intromissões, dir-se-iam despropositadas, na história. Além de abundarem as frases e ideias herméticas a que Clarice nos habituou e que podem intimidar o leitor incauto.

Também penei um pouco durante a leitura inicial, os nossos santos não casam ou seja lá o que for. Até que cheguei à p. 28, onde se diz de Macabéa: "Ela pensava que a pessoa era obrigada a ser feliz. Então era." Como se as coisas fossem simplesmente assim: "aperta-se o botão e a vida acende. Só que ela não sabia qual era o botão de acender." (p. 29) Por aqui já se tem um vislumbre do que ela foi, é e viria a acontecer. 

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Macabéa (que nome tão bonito!) é desconcertante, pois "ficava olhando as vitrines faiscantes de jóias e roupas acetinadas - só para se mortificar um pouco. É que ela sentia falta de se encontrar consigo mesma e sofrer um pouco é um encontro." (p. 35)

Se você, leitor casual e que chega de novo a Clarice, ainda não se convenceu a lê-la, não sei que mais (trans)escrever para o cativar. Garanto que vai gostar de Macabéa e que vai querer ser amigo, solidário e protetor dela, especialmente quando ouvir o que Olímpico lhe disse na hora de terminar a relação entre eles: "Você, Macabéa, é um cabelo na sopa. Não dá vontade de comer. Me desculpe se eu lhe ofendi, mas sou sincero. Você está ofendida?" (p. 60) 

Quando Clarice, dissimulada no narrador, a meses de morrer e saber que ia morrer, escreveu isto, porventura em jeito de testamento, "Estou absolutamente cansado de literatura; só a mudez me faz companhia. Se ainda escrevo é porque nada mais tenho a fazer no mundo enquanto espero a morte" (p. 70), sobram motivos para a ler devotamente.

 

Para uma boa introdução ao livro, ilustrando que não estamos sozinhos a tentar ler mais e melhor, veja aqui: https://www.youtube.com/watch?v=xi1fwf1wB1Q&ab_channel=LerAntesdeMorrer

O filme completo do livro está no You Tube: https://www.youtube.com/watch?v=MBxAMJvSip0&ab_channel=FilosofandoCi%C3%AAnciashumanasemdebate